Padre João Medeiros Filho
No próximo dia dez, celebrar-se-á o décimo oitavo aniversário de vida em plenitude de Dom Nivaldo Monte, segundo arcebispo metropolitano de Natal (1967-1988). Na liturgia católica, festejam-se os eleitos de Deus na data de sua volta para a Casa do Pai e não no dia de seu nascimento terreno. “Mors vere dies natalis hominis” (A morte é o verdadeiro natalício do ser humano), afirmou Santo Agostinho. Os restos mortais de Dom Nivaldo repousam no silêncio do Mosteiro de Sant’Ana de Emaús (Parnamirim), em meio à natureza, permanente bálsamo divino. Lá, os pássaros esvoaçam, como numa dança de alegria e as rosas espargem perfume sobre a sua sepultura. Os fiéis, que por ali passam, demonstram o quanto ele era amado em vida, cultuando a sua memória.
Muito poderá ser dito sobre esse pastor. Múltiplo pelas atividades exercidas: bispo, escritor, professor, músico, poeta e botânico. Uno, porque nele tudo convergia para o Mestre. “Para mim o viver é Cristo” (Fl 1, 21) era o seu lema episcopal. No final de seus dias, marcados pela enfermidade, acentuou a certeza de que o importante não é a duração da existência e sim a intensidade do amor com que se vive. E isso o fazia com maestria e profundidade, a ponto de intitular uma de suas obras: “O coração é para amar.” Em seus últimos dias, concelebrava com ele a Eucaristia, quando me dizia sempre: “Vamos cantar a beleza da vida e o amor sem igual.”
Dom Nivaldo costumava chamar as plantas, que admirava e cuidava, de “catequese de Deus”. Não fazia discursos sobre ecologia. Sempre demonstrou um grande respeito à natureza, imagem do Belo e Sagrado. Adquiriu terras, não para acumular bens, mas preservar o solo fecundo – presente de Deus aos homens – a fim de torná-lo berço de frutos e dons. O objetivo precípuo era proclamar a riqueza da dádiva sobrenatural às criaturas humanas. Para ele, “nossa mãe terra é extensão do colo divino.” Apaixonado pelos jardins, pomares e hortas, cultivava-os em Emaús e denominava-os “meus irmãos”, usando uma expressão franciscana. Deixou-nos inúmeros testemunhos de ternura e bondade. Quantas histórias edificantes a seu respeito, marcadas de encanto e paz poder-se-iam contar.
Ao preservar sua memória, sirvam-nos de lição as sábias palavras de Santa Bernadete, testemunha dos acontecimentos, em Lourdes: “Quando se for escrever a história daquilo que aqui aconteceu, deve-se procurar ser fiel.” Ao recordar Dom Nivaldo, a verdade que desponta diante de todos é a de um homem místico, irradiando simplicidade, sabedoria, otimismo, acolhimento e perdão. Era um ardoroso defensor da natureza, filha esplendorosa de um Deus do silêncio eloquente. Aqueles que se dedicam à paz e justiça brilharão para sempre como estrelas. No firmamento celeste, cintila uma luz que nos acalenta: Dom Nivaldo. Exemplo e incentivo para os cristãos e o povo potiguar, que tanto amara. Em reconhecimento e gratidão a tudo o que ele foi e realizou, a Câmara Municipal de Parnamirim, aprovou a Lei 2.307/22, denominando Dom Nivaldo Monte uma rua de Emaús, que ladeia sua antiga granja, localizada às margens da BR 101.
Dom Nivaldo, em seu despojamento, homenageando a terra que cultivara, descansa no solo que abençoou. Era um sacerdote em permanente comunhão com Deus e as criaturas. Ver um arcebispo inumado de forma tão simples e telúrica, talvez cause surpresa a alguns. Cumprindo seu desejo, na lápide tumular constam apenas seu nome, as datas de nascimento e partida para a eternidade e seu lema episcopal em latim. Faz-nos lembrar Léon Bloy: “Quero para mim a beleza, a quietude e o silêncio do Infinito.” Nosso inesquecível arcebispo não quis ser sepultado em igreja. Ali, não haverá colibris em voo rasante, saudando o santo e sábio que descansa no chão sagrado de Emaús. Nos templos, faltaria o brilho do sol aquecendo sua última morada, nem flores para perfumá-la. Em Emaús, as mãos orantes e piedosas das irmãs contemplativas e adoradoras eucarísticas (Filhas de Sant’Ana) depositam em seu túmulo girassóis (que especialmente o encantavam), rosas e preces de gratidão por todo o seu amor à Igreja de Cristo. Sobre ele, poder-se-ia aplicar a frase evangélica: “In finem dilexit”, ou seja, “Amou até o fim” (Jo 13, 1).
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